Vira e mexe encontro textos defendendo o livro de papel. Me parece assunto oco. Não me pergunto se o livro de papel continuará existindo ou se será substituído pelo ebook reader. Nessa órbita de assuntos, os problemas interessantes são:
- Qual é o grau de controle que o leitor terá do produto que comprar?
- Qual será a nova função a ser desempenhada pelas editoras no momento em que coordenar impressão e distribuição deixa de ser necessário?
- E ainda: o conceito de livro enquanto artefato para a transmissão de cultura sobreviverá ou se transmutará, por exemplo, em algo parecido com jogos ou quebra-cabeças narrativos, pela aplicação da interatividade e da animação?
O problema de ter o texto impresso em papel, o carinho pelo objeto físico, é compensado por outras vantagens: ter dicionário integrado para consultar instantâneamente, poder ajustar o contraste da página e - difícil de conceber -ter sempre a própria biblioteca a tiracolo.
Li recentemente anúncios da Amazon e da Pearson sobre crescimento expressivo na venda de ebooks, mas, ao contrário de trazer estabilidade, a mudança de plataforma de papel para digital deve aumentar a instabilidade no setor. É uma opinião fundada em experiência direta.
Um dos estímulos para comprar o IPad foi para fazer esse salto e, para a minha surpresa, depois de um mês, ainda não comprei nenhum ebook contra quatro novas aquisições impressas.
Movido pelo desejo de comprar livros automaticamente a partir de uma (supostamente) quase infinita variedade de opções, investi algumas horas nos últimos 30 dias tentando encontrar algo para ler no catálogo de ebooks da Amazon. E nada.
Uma parte do problema tem a ver com preço. O livro de papel tem um componente físico que aparentemente faz com que o preço dos itens seja parecido, digamos: algo entre US$15 e US$25. Já o ebook varia de grátis, passando pelos bem baratos - em torno de US$1 - por serem conhecidos e com copyright vencido, até os que valem mais de US$10.
Isso prejudica o sistema de avaliação que é uma das vantagens oferecidas pela Amazon. Livros grátis e quase grátis tendem a ser muito mais adquiridos, mas, nesse caso, “mais vendido” não é um indicativo preciso de novidade interessante.
Há outro elemento que dificulta a experiência de compra: no mercado americano, o livro é disponibilizado em dois momentos, primeiro como capa-dura, que é mais caro, e meses depois como capa-mole. E parece que o ebook só fica disponível junto com a edição mais batata.
O resultado é que a publicidade para o lançamento do livro não serve para alavancar a venda dos ebooks, que neste ponto ainda não estão disponíveis. Quando eles finalmente aparecem, a ferramenta de busca por avaliação, pelo motivo descrito acima, não serve para diferenciar as novidades bacanas dos muitos outros volumes com preços variáveis.
Já a experiência de ir a uma livraria tem sido um tormento, mas pelo motivo oposto: há estantes, os livros mais novos e interessantes estão em destaque e após uma passagem de olhos já estou fisgado. Em minutos descubro coisas que passaram a fazer falta quando eu descobri sua existência.
A aceleração do crescimento da venda de livros se deu APESAR da indisponibilidade de prateleiras digitais eficientes.
Fico me perguntando como está o cotidiano das pessoas que tem vivido esse processo, cada vez mais levados à beira do abismo de ter que mudar a hierarquia do produto, transformando o ebook em prioridade.
Milhares de livros disponibilizados a baixo custo, em formato digital, e seus produtores tendo que sobreviver comercialmente frente a possibilidade de popularização de softwares para quebrar a proteção desses arquivos e disponibilizá-los nas redes abertas de compartilhamento.
Enfim, talvez o livro deixe de ser a galinha de ovos das editoras e se torne a isca “freemium” para algum outro modelo de negócio que envolva, por exemplo, algum tipo de curso online. Por que não?